Ampliação da Base de Cálculo do IBS para Planos de Saúde: o que muda com a LC nº 214/2025

A Lei Complementar nº 214/2025 trouxe novas regras sobre a incidência do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) no setor de planos de assistência à saúde.

Embora o texto tenha sido criado para regulamentar o novo modelo previsto na Constituição, parte de suas disposições levantou dúvidas sobre a compatibilidade entre a materialidade definida para o imposto e a forma como sua base de cálculo foi ampliada.

O ponto central é entender até onde o IBS pode alcançar quando se trata das receitas das operadoras de saúde e se algumas dessas receitas realmente representam o serviço prestado ao beneficiário.

Materialidade do IBS segundo a LC nº 214/2025

De acordo com o artigo 234 da lei, o IBS incide sobre a prestação de serviços de planos de assistência à saúde. Em outras palavras, o imposto deve alcançar apenas aquilo que corresponde ao serviço efetivamente prestado pelas operadoras aos beneficiários.

Os contratos de planos de saúde são definidos como serviços contínuos que garantem cobertura assistencial mediante pagamento pré ou pós-estabelecido. Essa cobertura pode ser prestada diretamente pela rede própria, por prestadores credenciados ou por meio de reembolso ao beneficiário.

Ou seja, a materialidade tributável é a atividade de garantir a assistência à saúde conforme previsto no contrato. Atividades que não se relacionam a essa prestação não deveriam compor a incidência do IBS.

Base de cálculo e a relação com a capacidade contributiva

Embora distintos, materialidade e base de cálculo devem caminhar juntas. A Constituição exige que os impostos reflitam capacidade contributiva, o que significa que a base de cálculo precisa representar a expressão econômica do fato gerador.

Autores como Paulo de Barros Carvalho e Luís Eduardo Schoueri reforçam que a base de cálculo não pode extrapolar os limites da materialidade definida. Quando isso ocorre, abre-se espaço para tributar fatos econômicos que pertencem a outros tributos, rompendo a lógica do sistema.

O que a LC nº 214/2025 mudou na base de cálculo

Antes da EC nº 132/23, a jurisprudência já entendia que, nos planos de saúde, a base de cálculo deveria refletir apenas a remuneração líquida das operadoras pela cobertura assistencial: ou seja, mensalidades recebidas menos despesas assistenciais.

A LC nº 214/2025, porém, alterou esse cenário. O artigo 235 incluiu na base de cálculo do IBS as receitas financeiras provenientes dos ativos garantidores e das reservas técnicas das operadoras.

Essas receitas, no entanto, não derivam da prestação de serviços aos beneficiários. São resultados de aplicações financeiras exigidas pela regulação do setor. Assim, sua inclusão amplia a base para além da materialidade definida no artigo 234.

Como essas receitas se aproximam da materialidade de tributos sobre renda ou operações financeiras, a ampliação tem sido criticada por contrariar os princípios da capacidade contributiva e da legalidade, ao tributar manifestações econômicas alheias ao serviço prestado.

Por que essa ampliação é problemática?

Receitas financeiras de reservas técnicas não representam pagamento por serviço ao beneficiário. Elas existem porque as operadoras precisam manter recursos aplicados para cumprir normas regulatórias.

Tributar esses valores significa deslocar a incidência do IBS para fatos que não fazem parte da prestação de serviços assistenciais, contrariando o próprio desenho constitucional do imposto.

Além disso, como essas receitas já sofrem tributação no âmbito financeiro (pelas instituições que prestam o serviço financeiro), sua inclusão no IBS cria sobreposição de materialidades.

Conclusão

A forma como a LC nº 214/2025 ampliou a base de cálculo do IBS para incluir receitas financeiras relacionadas às reservas técnicas das operadoras sugere incompatibilidade com os princípios constitucionais da capacidade contributiva e da legalidade.

Ao eleger os serviços de planos de saúde como materialidade do imposto, o legislador criou uma autolimitação: somente manifestações econômicas vinculadas a esse serviço poderiam ser tributadas. Portanto, incluir receitas financeiras no cálculo do IBS implica um alargamento indevido da incidência, avançando para materialidades que não pertencem ao imposto.


Fonte: ConJur

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